crónica
Até dia 29 de Novembro, "O Crime do Padre Amaro", de Carlos Coelho da Silva, foi visto por 218.500 espectadores. Este valor coloca-o entre os cinco filmes portugueses mais vistos de sempre, nomeadamente "Tentação", de Joaquim Leitão, "Adão e Eva", do mesmo realizador, "Zona J", de Leonel Vieira, e "Jaime", de António Pedro Vasconcelos. A pergunta que se torna necessária fazer é "porquê?"
Entre os últimos filmes portugueses que tive oportunidade de ver recentemente nas salas de cinema, "O Crime do Padre Amaro" é, na minha opinião, um dos piores - o argumento não é coeso, o ritmo veloz que chegou a ser elogiado resulta de cortes abruptos que deixam o espectador perdido, ao ponto de ter como única orientação temporal a gravidez de uma das personagens. É certo que adapta uma obra maior da literatura portuguesa, mas fá-lo livremente, dando um novo rumo à própria caracterização, contexto e destino das personagens. Confesso que me senti defraudada quando vi o filme, especialmente depois da excelente adaptação de "El Crimen del Padre Amaro", realizado em 2002 pelo mexicano Carlos Carrera. Para mim, prova que o argumento continua a ser a maior fragilidade do cinema português - por vezes, a ideia é muito boa (veja-se "A Mulher que Acreditava Ser Presidente dos Estados Unidos da América), a qualidade dos actores é elevada, mas mesmo assim algo parece falhar.
Os pontos "fortes" d' "O Crime". É certo que o filme do português Carlos Coelho da Silva conta com o apoio da SIC, estação televisiva onde será transmitido mais tarde, depois de ter esgotado ao máximo as receitas das bilheteiras das salas de cinema, numa mini-série que, espero, talvez tenha mais sentido, porque inclui tudo aquilo que não coube em 100 minutos. É certo que tem dois jovens sensuais como protagonistas, o padre Amaro (Jorge Corrula) e a sua Amélia (Soraia Chaves). É certo que tem hip-hop, gangs, rusgas policiais, que parecem pequenas cenas de outros filmes, nesse caso norte-americanos (tão mais comerciais que o cinema nacional). É certo que retrata negativamente a Igreja Católica e os seus ministros, ao ponto de se tornar mera caricatura. É certo que conta com bons desempenhos - como o de Rui Unas ou Nicolau Breyner. É certo que faz rir e são as poucas cenas de comédia que realmente ficam após os referidos 100 minutos. Contudo, será essa a fórmula do sucesso para o cinema português?
Eu preferia melhores argumentos, porque tudo o resto acaba por ser como o fogo de artíficio - é belo, mas termina rapidamente. E quem é que consegue descrever fielmente uma sessão de fogo de artíficio? Ficam apenas algumas cores, algumas formas. Valeria a pena perguntar aos espectadores de "O Crime do Padre Amaro" o que é que recordam do filme. E repetir a questão daqui a um ano. A meu ver, tudo começa mal quando aos nos primeiros minutos, a história principal é subitamente interrompida por uma história secundária, sem qualquer "raccord" perceptível. Falha gravemente. Ou talvez não, dizem os números.
Ana Filipa Gaspar
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